A maioria das pessoas que passam pela cidade de Dom Expedito Lopes, a 290 km de Teresina, não imagina a história do personagem que dá nome ao município. Nascido no interior do Ceará, o religioso Francisco Expedito Lopes foi o primeiro bispo da Diocese de Oeiras, no Piauí, entre 1948 e 1955.
No período em que comandou a igreja na região de Oeiras, se tornou uma figura muito popular e querida. Em 1955, Dom Expedito foi transferido para Garanhuns, no estado de Pernambuco. Foi lá onde, dois anos mais tarde, em 1957, acabou assassinado a tiros por um padre de uma cidade vizinha, vinculada à sua Diocese.
Dom Expedito havia sido designado para assumir a Diocese de Garanhuns justamente com a missão principal de resolver impasses com alguns sacerdores de paróquias da área. Um deles era relacionado ao padre Hosana de Siqueira e Silva, da paróquia de Quipapá, município subordinado à Diocese de Garanhuns.
Relação do padre com mulheres
Pesava sobre o padre a acusação de que tinha um envolvimento amoroso uma prima, que trabalhava como empregada doméstica na casa paroquial. Na época, havia até relatos de que ela tinha sido obrigada a fazer dois abortos de filhos do padre.
Com a prima retirada da casa paroquial, padre Hosana arranjou outra mulher, com quem, segundo as denúncias, dormia. Apesar das ordens de Dom Expedito para deixar a prática, o padre desobedecia e alegava que tudo não passava de fofocas contra ele.
Diante das seguidas desobediências, o bispo se viu obrigado a suspendê-lo de ordens. No direito canônico católico, a suspensão de ordens é uma punição que proíbe um sacerdote de algumas ou todas as suas funções, como o direito de celebrar missas, de exercer um cargo ou de receber benefícios.
A decisão de Dom Expedito Lopes de suspender o padre Hosana seria lida na rádio Difusora de Garanhuns.
Ao saber que a punição se tornaria pública, o padre tentou convencer um outro sacerdote que organizava o programa de rádio a deixá-lo se defender das acusações na emissora, pedido que foi negado. Enfurecido, ele se deslocou de Quipapá em um jeep até Garanhuns no dia 1º de julho de 1957 armado com um revólver e disparou três tiros contra Dom Expedito Lopes.
O bispo ainda chegou a ser levado para o Hospital Regional de Garanhuns, onde foi atendido por uma equipe do médico Otoniel Gueiros, que era pastor envangélico. Apesar dos esforços, morreu oito horas depois, na madrugada do dia 2 de julho. Padre Hosana fugiu.
Perdoou o assassino
Antes de morrer, Dom Expedito Lopes disse que perdoava o padre. Ao chegar para dar a extrema-unção, monsenhor José de Anchieta Callou ouviu a última frase de Dom Expedito: “Padre Hosana me matou. Perdoe esse pobre sacerdote”, teria dito, conforme publicações da época, num gesto cristão de misericórdia.
Na época, o crime teve repercussão mundial e causou perplexidade na Igreja. Foi o primeiro caso na história da Igreja Católica na América Latina em que um padre matou um bispo.
Padre foi preso
Na mesma semana, padre Hosana foi preso e depois enviado para a Casa de Detenção de Recife. Ele passou por três julgamentos. Chegou a ser inocentado tendo como tese a legítima defesa da honra. No terceiro julgamento, foi condenado a 19 anos de prisão, dos quais cumpriu 11 anos devido ao bom comportamento na cadeia.
Na prisão, fala-se que ele vestia bata e até celebrava missas. Em 1968, padre Hosana foi morar em um sítio da sua família próximo ao município de Correntes-PE, onde nasceu. Apesar de ter sido excomungado durante a prisão, ele construiu uma pequena capela, continuou a rezar missas, quase sem fiéis, e ministrar sacramentos.
Também morreu assassinado
Em novembro de 1997, aos 84 anos, padre Hosana foi brutalmente assassinado com pauladas na cabeça, em sua propriedade no interior de Correntes. O crime nunca foi esclarecido. O corpo dele foi levado ao IML de Recife para exames.
Conforme matéria da época do jornal Folha de S. Paulo sobre a morte do padre, Hosana vinha tentando obter o perdão do Vaticano pelo assassinato do bispo e, na última visita do papa João Paulo II ao Brasil, tentou - sem conseguir - um encontro com ele.
A solicitação feita ao Vaticano também não foi respondida.
A homenagem no Piauí
O município de Dom Expedito Lopes foi emancipado em 1964, sete anos após a morte do bispo. Desmembrado de Oeiras, tem atualmente 6,5 mil habitantes. A colocação do nome do religioso no município é uma das maiores homenagens feitas a ele, em reconhecimento ao seu legado como primeiro bispo de Oeiras.